quarta-feira, outubro 28, 2020

Reflexões

 

                                Os dias passam,

                           As vidas vão e ficam.

                           Deixam marcas indeléveis

                           Em nossa história.

                           Lembranças...

                           Algumas boas e outras nem tanto.

                           Todas moldam quem somos,

                           Cicatrizes que permanecem

                           No corpo e na memória.

                           Rimos, choramos,

                           Algumas vezes brigamos.

                           Momentos verdadeiros e singulares.

                           Ah! Quantas saudades...

                           Dos dias, das vidas e dos lugares.

                           Os dias passam,

                           As vidas vão e ficam.

                                                   

sábado, outubro 24, 2020

LUTERO E A REFORMA PROTESTANTE

Observa-se que no final da Idade Média a igreja deixou de ser uma comunidade de discípulos de Cristo e tornou-se uma instituição poderosa e secular, a qual dominava a sociedade europeia em quase todos os aspectos. Diversos fatores se conjugaram para formar o ambiente no qual floresceu a reforma religiosa do século XVI: transformações nos campos político, social, econômico, intelectual e geográfico. 

O historiador Lucien Febvre descreveu o período que antecedeu a Reforma Protestante como um período de “imenso apetite pelo divino”, contudo era uma espiritualidade profundamente insatisfatória e, conforme nos diz Timothy George, “a maior realização da Reforma foi ter sido capaz de redefinir essas ansiedades sob o aspecto de novas certezas, ou melhor, velhas certezas redescobertas.”.  O monge agostiniano chamado Martinho Lutero refletiu bem o espírito de sua época, buscava inquietantemente alcançar a salvação e tentou satisfazer os anseios de sua alma com suas próprias realizações. Portanto, a Reforma do século XVI foi um movimento eminentemente religioso.


Contudo, em novembro de 1515, quando começou a expor a Epístola de Paulo aos Romanos em suas aulas na Universidade de Wittenberg, compreendeu a doutrina paulina da justificação pela fé somente.  Lutero declarou: “Ansiava muito por compreender a Epístola de Paulo aos Romanos, e nada me impedia o caminho, senão a expressão ‘a justiça de Deus’, porque a entendia como se referindo àquela justiça pela qual Deus é justo e age com justiça quando pune os injustos... Noite e dia eu refletia até que... captei a verdade de que a justiça de Deus é aquela justiça pela qual, mediante a graça e a pura misericórdia, Ele nos justifica pela fé. Daí em diante, senti-me renascer e atravessar os portais abertos do paraíso. Toda a Escritura ganhou novo significado e, ao passo que antes ‘a justiça de Deus’ me enchia de ódio, agora se me tornava indizivelmente bela e me enchia de maior amor. Esta passagem veio a ser para mim uma porta para o céu”. Ele aprendeu que a justiça de Deus não é uma exigência cujo cumprimento deve ser conquistado, mas um dom a ser recebido pela fé. A experiência de conversão de Lutero virou a piedade medieval de ponta cabeça.

Uma vez compreendida a doutrina da justificação, Lutero indignou-se com a venda das indulgências. As indulgências eram diplomas que garantiam o pleno perdão de pecados, ou a redução da punição. Em resposta Lutero afixou suas 95 teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, no dia 31 de outubro de 1517, com o título: Debate para o Esclarecimento do Valor das Indulgências.

O Rev. Dr. D. Martin Lloyd-Jones afirmou: “Para épocas especiais são necessários homens especiais; e Deus sempre produz tais homens”. São poucos os homens que têm sido um instrumento na mudança do curso da história. Martinho Lutero foi um deles.  

quinta-feira, outubro 08, 2020

TODAS AS COISAS COOPERAM PARA O NOSSO BEM - Romanos 8.28


A vida do cristão assemelha-se ao mecanismo do relógio. Quando abrimos um relógio o que vemos são engrenagens que giram em sentido anti-horário atreladas a outras que trabalham no sentido horário. A primeira impressão que temos é:  como isso parece funcionar? Tudo se mostra muito confuso! Contudo o relojoeiro construiu o mecanismo do relógio com uma mola mestra que controla todas as suas engrenagens, de modo que, ao se dar corda, todas elas trabalham juntas para mover os ponteiros em torno do mostrador precisamente na velocidade certa. Muitas engrenagens parecem trabalhar umas contra as outras, mas todas trabalham juntas com o mesmo propósito de mostrar o tempo exato.  É deste modo que Deus trabalha em nossas vidas. Paulo, inspirado por Deus, nos diz que “todas as coisas” - o que inclui as coisas boas e as coisas ruins que nos acontecem - “cooperam para o bem”. Ninguém naturalmente gosta da aflição. Muitas vezes as aflições nos são uma carga pesada e difícil de suportar. No entanto, devemos entender  e perceber que a Soberania de Deus desempenha um papel fundamental em todos os aocontecimentos da nossa vida - do mais agradável ao mais traumático e difícil de entender. Por mais maduros que sejamos, relutamos em aceitar ou mesmo perceber os propósitos de Deus em nossa vida. Porém, Deus usa todos os recursos necessários para cumprir o Seu propósito em nossas vidas. Ele nos chamou para sermos conforme a imagem de Seu Filho, Jesus. Ele trabalha em nós com este propósito: Levar-nos a “perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo”. Sendo assim, Deus usa até mesmos os nossos revesses e aflições para atingir Seu objetivo. Portanto, nesta noite quero alistar nove maneiras pelas quais Deus usa as nossas aflições para cooperar para o nosso bem.

 1. AS AFLIÇÕES PRODUZEM HUMILDADE.  A aflição não só faz o crente se humilhar diante de Deus, mas o conserva humilde. Beeke afirma que  “a aflição faz secar o reservatório do combustível que alimenta o seu orgulho” . É por meio das aflições que Deus nos ensina a mesma verdade que Ele ensinou ao povo de Israel em Deuteronômio 8: “que te concuziu por aquele grande e terrível deserto de serpentes abrasadoras, de escorpiões, e de secura, em que não havia água ...que no desrto te sustentou com maná..., para te humilhar, e para te provar, e afinal te fazer bem” (Dt 8.15,16).

2. AS AFLIÇÕES PRODUZEM CRESCIMENTO. O Espírito Santo usa a aflição como um remédio para acabar com a enfermidade mortal do pecado em nossas vidas, fazendo-nos produzir frutos saudáveis e piedosos. A aflição é o cão do pastor, enviado não para devorar as ovelhas, mas traz^-las de volta ao aprisco. Lembram-se da experiência de Davi? Ele afirmou: “Antes de ser afligido andava errado, mas agora guardo a tua palavra” (Salmo 119.67). Você sabe que em alguns países certas árvores crecem, mas não dão frutos, por nõa haver inverno ali? O cristão precisa de invernos de aflições para experimentar o florescer das primaveras, o crescimento do verão e a colheita de outono.

3. AS AFLIÇÕES PRODUZEM O DESEJO DA COMUNHÃO. Deus se utiliza da aflição como um meio de fazer o seu povo buscá-lo, para trazê-lo de volta a comunhão e mantê-lo junto ao seu lado. Em Oséias 5.15 lemos: “estando eles angustiados, cedo me buscarão”.  Deus não usou a tempestade para despertar em Lutero o desejo de dedicar-se a vida religiosa?  As tempestades e o granizo da aflição levam as ovelhas para mais perto do seu pastor.

4. AS AFLIÇÕES PRODUZEM A IDENTIFICAÇÃO COM CRISTO. Deus usa as aflições para nos moldar à semelhança de Cristo, fazendo-nos participantes dos seus sofrimentos e da sua imagem. Na carta aos Hebreus lemos  que “Deus, porém, nos disciplina para aproveitamento, a fim de sermos participantes da sua santidade” (Hb 12.10). Beeke nos faz uma indagação: “Caro irmão, não é nos tempos de sofrimento que normalmente você tem mais comunhão com Jesus Cristo em seus sofrimentos - numa vida inteira que, como diz Calvino, não foi outra coisa senão uma série de sofrimentos? Pode então você reclamar da leve cruz que você tem de suportar sendo um pecador culpado, quando você vê a pesada cruz que Cristo teve de suportar sendo inocente?”

5. AS AFLIÇÕES PRODUZEM ALEGRIA.  As aflições espirituais cooperam para o nosso bem porque o Senhor as contrabalança com consolo e alegria espirituais. Onde quer que existam os sofrimentos de Deus, haverá consolação de Deus. Em 2 Co 1.4,5: “É Ele que nos conforta em toda a nossa tribulação, para podermos consolar os que estiverem em qualquer angústia, com a consolação com que nós mesmos somos contemplados por Deus. Porque, assim como os sofrimentos de Cristo se manifestam em grande medida a nosso favor, assim também a nossa consolação transborda por meio de Cristo”. A alegria vem pela manhã. Deus transforma a água em vinho.

6. AS AFLIÇÕES PRODUZEM FÉ.  A aflição também coopera para o bem fazendo os filhos de Deus andarem por fé e não por vista. Se fosse permitido ao cristão sempre desfrutar dos prazers e alegrias deste mundo, eles passariam a amar esta e a depender de suas provisões espirituais a invés de depender dAquele que tudo provê. 

7. AS AFLIÇÕES PRODUZEM ESPERANÇA. A aflição é proveitosa para preparar o povo de Deus para sua herança celestial. A aflição eleva as suas almas até o céu, para buscarem “a cidade que tem fundamentos, da qual Deus é o arquiteto edificador” (Hb 11.10).  Paulo escreveu que “a nossa leve e momentanea tribulação produz para nós eterno peso de glória, acima de toda comparação” (2Co 4.17).

Ainda que o vento da aflição seja contrário a sua carne, Deus se agrada em usá-la para nos conduzir ao céu. Portanto, “em tudo (até mesmo nas aflições) dai graças, porque esta é a vontade de Deus em Cristo Jesus para convosco”.

segunda-feira, outubro 05, 2020

O TESTEMUNHO DE JOÃO BATISTA (João 1.6-13)


O apóstolo João, depois de começar o seu evangelho com uma afirmação sobre a natureza divina do Senhor Jesus Cristo, passa a falar do antecessor de Cristo, João Batista. Devemos notar o contraste entre a linguagem que o apóstolo usou, ao falar do Salvador e do seu

antecessor. Sobre Jesus ele diz que é o Deus eterno, o Criador de todas as coisas, a fonte de luz e vida. Sobre João Batista ele diz simplesmente:
“Houve um homem enviado por Deus cujo nome era João”
Primeiro, observe que João Batista veio para dar testemunho da verdade de Deus: “Este veio como testemunha para que testificasse a respeito da luz, a fim de todos virem a crer por intermédio dele”. Ele não é um sacerdote e nem um mediador entre Deus e o homem. O seu ministério consistiu em dar testemunho da verdade de Deus, especialmente da verdade de que Cristo é o único Salvador e a Luz do mundo. Podemos dizer, então, que todo pastor será fiel ao seu ofício, quando der um testemunho completo acerca de Cristo. E, se realmente testifica de Cristo, estará fazendo sua parte e receberá seu galardão, mesmo que seus ouvintes descreiam de seu testemunho.  A grande finalidade do testemunho de um pastor é que, através dele, os homens venham a crer (Jo 1.7). 
Segundo, vemos nesses versículos que Jesus é “a verdadeira luz, que, vinda ao mundo, ilumina a todo homem”.  Assim como o sol, Jesus brilha para o benefício de toda a humanidade — o rico e o pobre, o de alta e o de baixa posição, para o judeu e para o grego. Assim como o sol, Jesus está ao acesso de todos. Todos podem olhar para Ele e sorver da saúde que procede de sua luz. Quer o homem veja, quer não, Cristo é o verdadeiro sol e a luz do mundo. Não há outra luz para os pecadores, a não ser o Senhor Jesus Cristo.
Terceiro, vemos também nesses versículos a grande impiedade do coração natural do homem: “o mundo foi feito por intermédio dele, mas o mundo não o conheceu. Veio para o que era seu, e os seus não o receberam”. Cristo veio visivelmente ao mundo quando nasceu em Belém, mas foi tratado com indiferença. Veio para o povo que Ele mesmo havia tirado do Egito e comprado para si. Veio para os judeus, a quem havia separado dentre as nações e revelado a si mesmo, através dos profetas. Veio para aqueles judeus que liam a seu respeito no Antigo Testamento, viam-No através de símbolos e figuras nos cultos realizados no templo e professavam estar aguardando sua vinda. Todavia, quando Ele veio, estes mesmos judeus não O receberam. Na verdade, eles O rejeitaram, desprezaram e O mataram. Com razão o coração natural é chamado de “desesperadamente corrupto” (Jr 17.9).
Por último, vemos nesses versículos os muitos privilégios de todos os que recebem a Cristo e nEle crêem: “a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, aos que crêem no seu nome”.  Se a grande maioria dos judeus não o recebeu como o Messias, houve pelo menos alguns que não O rejeitaram. A estes Ele deu o privilégio de serem filhos de Deus e os adotou como membros da família do Pai. Reconheceu-os como seus irmãos e irmãs. Tais privilégios, devemos lembrar, são possessões de todos os que, em todos os tempos, pela fé recebem a Cristo como Salvador e O seguem. Estes são “filhos de Deus mediante a fé em Cristo Jesus” (GI 3,26). São nascidos de novo, mediante um novo e celestial nascimento, e adotados na família do Rei dos reis. E nós, somos filhos de Deus? Já nascemos de novo? Temos as marcas que acompanham o novo nascimento — senso do pecado, fé em Cristo, amor ao próximo, vida de retidão e separação do mundo? Enquanto não dermos respostas satisfatórias a estas perguntas, não estejamos contentes.  Desejamos realmente ser filhos de Deus? Então, recebamos a Cristo como nosso Salvador e creiamos nEle de coração. À todo aquele que O recebe desta forma Ele dá o privilégio de se tornar filho de Deus.

Texto adaptado do livro As Meditações no Evangelho de João de J. C. Ryle

quinta-feira, setembro 17, 2020

A CARTA AOS FILIPENSES: UMA INTRODUÇÃO

Introdução

Para muitos autores, Filipenses é a carta mais encantadora que Paulo tenha escrito jamais. Foi chamada de duas maneiras: A epístola das coisas excelentes — como efetivamente o é — ou A epístola da alegria. Escreve: “Alegrai-vos sempre no Senhor; outra vez digo: alegraivos.” Várias vezes aparecem as palavras alegria e regozijo. Enquanto está na prisão dirige os corações de seus amigos — e nossos corações — a uma alegria da qual ninguém pode nos privar.1 Embora em circunstâncias humanamente tão desfavoráveis, uma vez que o apóstolo estava preso por causa do Evangelho, Paulo estava confiante no Senhor. Nesta carta ele expressou todo o seu ânimo, incentivando os filipenses a desenvolverem em parceria com o Espírito Santo esse aspecto do fruto espiritual, a alegria cristã.

A vida cristã é uma corrida em direção ao alvo. Paulo escreveu: Irmãos, quanto a mim, não julgo havê-lo alcançado; mas uma coisa faço: esquecendo-me das coisas que para trás ficam e avançando para as que diante de mim estão, prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus (Filipenses 3.13,14). Não podemos nos desviar nem para a direita nem para a esquerda; tampouco podemos parar. A Epístola aos Filipenses oferece subsídios a todos quantos estão prosseguindo para o alvo. É uma mensagem de estímulo ao desenvolvimento da salvação, através de uma vida consagrada, bem firmada na Palavra e cheia de esperança, a qual nos exorta a viver alegremente, desenvolvendo uma conduta santa e valorizando a cooperação entre os membros da família da fé. Convido você a iniciar esta jornada conosco.

 1. O apóstolo Paulo e a Igreja de Filipos

Paulo foi chamado para ser apóstolo dos gentios e assim percorria as estradas romanas anunciando o Evangelho e organizando os discípulos nas principais cidades das províncias imperiais, que eram centros estratégicos. É nestes centros que ele concentrou suas atividades evangelísticas e tinha como objetivo alcançar o maior número de pessoas possível. Fo durante a sua segunda viagem missionária que ele e seus companheiros, chegaram em Filipos, de pois de ter uma visão, na qual um varão macdônio lhe pedia para ir à Macedônia (Atos 16.6-10). Filipos, cidade que desfrutava do status de colônia romana era um centro importante não só por sua condição polítca, mas também geográfica e comercialmente, foi a primeira cidade da região macedônica a receber Paulo e seus companheiros (Atos 16.11,12).

O registro de Atos dá conta da primeira conversão acontecida naquela região: Lídia, uma mulher piedosa e comerciante. Lídia, chegou da Ásia com seus tesouros, para em seguida descobrir na Europa os tesouros espirituais.2 Além dela, converteu-se a Cristo a jovem que fora tomada por um espírito maligno; e, ainda, a família do carcereiro da cidade (talvez alguns detentos também tenham se convertido). Estava plantada assim a semente da igreja cristã naquela cidade. Alguns anos mais tarde, Paulo escreveu uma mensagem para aquela igreja. O apóstolo voltaria a visitar aqueles crentes por ocasião da terceira viagem missionária, provavelmente no ano 57 (At 20.1,2) e ainda no ano seguinte (At 20.3-6). Há que se fazer uma observação aqui. É possível perceber o caráter universal do Evangelho. Em Atos 16, a narrativa se concentra em três personagens de diferentes nacionalidades: Lídia, uma distinta vendedora, asiática, da cidade de Tiatira; uma jovem escrava, que era de um dos países derrotados por Roma nas suas constantes conquistas; e, por último, o carcereiro, que era cidadão romano.3

A leitura da Epístola aos Filipenses deixa claro que havia uma relação de muito carinho entre os crentes filipenses e Paulo. Pelo menos em duas ocasiões, eles colaboraram financeiramente com o seu ministério: quando ele estava em Tessalônica (Fp 4.15,16) e, depois, quando estava em Corinto (II Co 11.9). Quando Paulo escreve a Epístola aos Filipenses, o faz para agradecer aos crentes o envio de outra oferta, que fora encaminhada por Epafrodito, o qual fora incumbido pela igreja especialmente para fazer a ajuda chegar às mãos do apóstolo (Fp 4.10-20). Curiosamente, ao se apresentar, Paulo não o faz como “apóstolo”, mas simplesmente como “servo de Jesus Cristo”.

Em Atos 16.13 observa-se que depois de chegar ali Paulo dirige-se “onde pareceu haver um lugar de oração”. Isto nos leva afirmar que havia poucous judeus em Filipos, pois neste lugar de oração não havia homens e nem havia um culto formal e nem leitura da lei e dos profetas. Portanto, este lugar de oração não se refere uma sinagoga, mas um lugar onde mulheres se reuniam para suas devoções de caráter judaico4. Assim é possível concluir que a igreja de Filipos era constituída em sua maioria por gregos convertidos ao evangelho de Jesus.  

A carta que Paulo escreveu aos cristãos da cidade de Filipos é um tesouro precioso. Não é sem razão que, ao longo dos séculos, a Epístola aos Filipenses tem alimentado a espiritualidade e a fé dos cristãos. Em um texto de apenas quatro capítulos, o apóstolo apresenta ensinamentos muitíssimo valiosos para a caminhada cristã. Filipenses não é um tratado doutrinário propriamente; antes, é um texto fortemente pastoral, isto é: um texto que apresenta a mensagem do coração de um dedicado pastor à igreja que ama. Filipenses não é uma carta famosa e conhecida como Romanos ou Efésios. Mas, nem por isso é menos importante para cristãos que querem crescer na fé. Percebe-se forte tom pessoal na carta: há 51 referências a pronomes pessoais (“eu”, “meu”, “mim”, “minha”, “me”). ​O presente estudo visa apresentar uma panorâmica da Epístola aos Filipenses. É apenas um “aperitivo”, com a intenção de despertar o desejo de estudar mais essa porção bíblica, com vistas ao aprofundamento da fé.

2. Data e ocasião

​Não é tarefa fácil afirmar de forma absoluta a data da redação dessa epístola. No entanto, tudo indica que deve ter sido escrita entre os anos 50 e 63 do primeiro século da era cristã. Mas essa questão é de somenas importância. O que vale realmente é a mensagem da epístola. Sabe-se também, com certeza, que quando Paulo escreveu essa carta estava preso: “E quero que vocês saibam isto, queridos irmãos: tudo quanto me aconteceu aqui tem sido uma grande ajuda na divulgação da Boa Nova a respeito de Cristo. Porque todo mundo aqui, incluindo todos os soldados, de ponta a ponta nos quartéis, sabem que estou na cadeia simplesmente porque sou cristão. E por causa da minha prisão muitos dos cristãos daqui parecem ter perdido o medo de ser presos! De algum modo minha resignação os animou e eles começaram a ter cada vez mais coragem para falar de Cristo aos outros.” (Fp 1.12-14, A Bíblia Viva). Ninguém sabe ao certo que prisão foi essa que Paulo enfrentou. Várias hipóteses já foram apresentadas. Alguns pensam que ele estava preso na própria Roma, a capital do Império. Outros pensam que a prisão foi em Éfeso, ou em Cesareia. Mas essa questão, no final das contas, não é tão importante. O que importa é que, mesmo preso, Paulo manda para a igreja dos filipenses uma mensagem, na qual importantes temas da vida cristã são tratados. É o que será visto a seguir.

 3. Principais temas da Epístola aos Filipenses

Como já foi dito, a carta aos Filipenses não foi escrita com a intenção de ser um tratado dogmático. Mas, essa mensagem pastoral de Paulo muito tem a nos ensinar. Em resumo, os principais temas da Epístola aos Filipenses são:

a)   Humildade – A cidade de Filipos era colônia romana, um alto privilégio no tempo do Novo Testamento (At 16.12). Um cidadão de Filipos tinha os mesmos direitos legais de um cidadão de Roma. Ser cidadão romano, naqueles dias, era o mesmo que ser cidadão dos Estados Unidos em nossos dias. Para crentes que viviam em um contexto assim, Paulo escreve recomendando a humildade. Em 3.20 está escrito: “pois a nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo.” A palavra traduzida como “pátria” significa literalmente “cidadania”. Paulo ensina que, mais importante do que ser cidadão romano, é ser cidadão da pátria celestial. A exortação à humildade, feita por Paulo, é forte: “nada façais por partidarismo ou vanglória, mas por humildade, considerando cada um os outros superiores a si mesmo.” Além disso, em uma passagem que se tornou muitíssimo conhecida (2.1-11), Paulo ensina aos crentes a que sejam humildes, tendo por modelo de humildade o próprio Senhor Jesus;

b) Inabalável comunhão com Cristo – Nessa epístola, encontramos a filosofia de vida do apóstolo Paulo: “porquanto, para mim, o viver é Cristo, e o morrer é lucro” (1.21). Conforme o pensamento paulino, a vida em Cristo, com Cristo e por Cristo supera até a morte (1.23,24). Aqueles que morrem no Senhor estão em um estado de consciente felicidade, além de qualquer realidade experimentada na terra. Esse ensinamento paulino nos enche de conforto e esperança;

c) Desafio à santificação – Em Filipenses 3.8 a 16, o apóstolo ensina a respeito da santificação, de uma maneira muito interessante: o crente não se baseia em seus próprios méritos, mas apenas nos méritos de Cristo Jesus (3.9,10). Ao mesmo tempo, a santificação é apresentada como algo que exige e envolve esforço dos crentes, os quais devem buscar seu progresso espiritual (1.9; 2.12-16; 4.8,9);

d) Solução de conflitos comunitários – A igreja dos filipenses era uma comunidade muito especial, carinhosa e amorosa para com o apóstolo. Contudo, havia conflitos naquela igreja. Paulo exorta aos crentes a que busquem a superação desses conflitos que, infelizmente, podem acontecer em qualquer igreja (2.14,15). No final da epístola, Paulo chega a citar nomes de pessoas envolvidas em um conflito: “Rogo a Evódia e rogo a Síntique, pensem concordemente no Senhor.” (4.2). Em qualquer igreja pode haver conflitos entre seus membros; mas todos devem se esforçar para que tais conflitos sejam solucionados;

e) Alegria – O tema da alegria cristã está presente em praticamente todo o texto da epístola (1.25; 3.1; 4.4,10). A alegria cristã não é exatamente um sentimento. É mais um modo de ser, uma atitude que leva o cristão a ver a vida, com seus altos e baixos, com base na fé no Senhor da igreja. Desse modo, é possível olhar além das crises que deprimem e desanimam e contemplar pela fé o Senhor soberano sobre todas as coisas.

 

Aplicação

A carta aos Filipenses, como vimos, é uma das cartas mais pessoais de Paulo e ocupa-se centralmente do seguinte:

Capítulo 1: Paulo fala da sua presente situação

Capítulo 2: O apóstolo anela possuir a mente de Cristo

Capítulo 3: Anela ter o conhecimento de Cristo

Capítulo 4: Anela ter a paz de Cristo

Deste nosso primeiro encontro podemos destacar duas lições importantes:

1)  Somos peregrinos neste mundo: Fp 1.27-29 e 3.20

2) Como Paulo, devemos ter estratégias para alcançar o maior número de pessoas com o Evangelho de Cristo.

 


1  Barclay, W. A Carta aos Filipenses, p.16.

2  Hendrickesn, W. Filipenses, p. 22.

3  De Souza, I. N. (2008). Filipenses: A Carta da Alegria (Primeira edição, p. 20). São Paulo, SP: Rádio Trans Mundial.

4  Hendricksen, W. Filipenses, p.20.

quinta-feira, setembro 10, 2020

A Natureza Divina de Cristo - João 1.1-5

Encontramos nestes versículos iniciais do Evangelho de João uma declaração de incomparável sublimidade a respeito da natureza divina do nosso Senhor Jesus Cristo. Acima de qualquer dúvida, quando João menciona “o Verbo” está se referindo a Cristo. Com toda certeza, há grande profundidade nesta declaração, cuja compreensão está muito além do entendimento do homem. Ainda assim, há claros ensinamentos na passagem, os quais todo crente deveria guardar como tesouro no coração, 
Primeiro, aprendemos que o Senhor Jesus Cristo é eterno. João diz que “no princípio era o Verbo”. Ele não começou a existir quando os céus e a terra foram formados e, muito menos, quando o evangelho foi trazido ao mundo. Ele tinha a glória com o Pai “antes que houvesse mundo” (Jo 17.5). Existia quando a matéria foi criada e antes que começassem os tempos. “Ele é antes de todas as coisas” (Cl 1.17); Jesus existe desde toda a eternidade. 
Segundo, aprendemos que o nosso Senhor Jesus Cristo é uma pessoa distinta de Deus, o Pai; e, ainda assim, é um com Ele. João diz que “o Verbo estava com Deus”. O Pai e o Verbo, embora sejam duas pessoas, são ligados por uma união inefável. Desde a eternidade, onde quer que Deus Pai estivesse, ali também estava o Verbo, o Deus Filho — iguais em glória, co-eternos em majestade, mas uma só Divindade. Este é um grande mistério. Feliz aquele que o recebe com a atitude de uma criança, sem tentar explicá-lo! 
Terceiro, aprendemos que o Senhor Jesus Cristo é o próprio Deus. João diz que “o Verbo era Deus”. Ele não é meramente um anjo criado ou um ser inferior a Deus, o Pai, investido de poder, da parte do Pai, para redimir os pecadores. Não é menos que o Deus perfeito; é igual ao Pai, no que concerne à sua divindade; Ele é Deus, possuindo a mesma natureza que o Pai e existindo antes da fundação do mundo. 
Quarto, aprendemos que o Senhor Jesus Cristo é o Criador de todas as coisas. João diz que “todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e sem ele nada do que foi feito se fez”. Longe de ser uma criatura de Deus, Ele é o Ser que fez o universo e tudo o que nele há. O apóstolo nos diz que Jesus “é o primogênito de toda a criação; pois nele, foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para ele” (Cl 1.15,16).
Por último, aprendemos que o Senhor Jesus Cristo é a fonte de toda luz e vida espirítual. João diz que “a vida estava nele, e a vida era a luz dos homens”. Ele é a fonte eterna, e somente dela os filhos dos homens têm recebido vida. Em todos os tempos, a maior parte da humanidade tem-se recusado a conhecê-Lo, esquecendo-se da Queda e da necessidade de um Salvador pessoal. A luz tem constantemente resplandecido “nas trevas”, e a maioria dos homens não a tem compreendido. Mas, aqueles que já receberam luz e vida espiritual, devem tudo isso a Cristo. 

*Texto adaptado do livro de J.C. Ryle - Meditações no Evangelho de João

sexta-feira, maio 08, 2020

A Incapacidade de Ir a Cristo » Robert Murray M'Cheyne

Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer; e eu o ressuscitarei no último dia (João 6.44)

Quão surpreendente é a depravação do homem natural! As Escrituras nos ensinam isso abundantemente. Todo pastor fiel levanta a sua voz como uma trombeta, para mostrar isto às pessoas. E a primeira obra do Espírito Santo, no coração, é convencer do pecado.

Na Palavra de Deus, não existe uma descoberta mais terrível sobre a depravação do homem natural do que estas palavras do evangelho de João. Davi afirmou: “Eu nasci na iniquidade, e em pecado me concebeu minha mãe” (Sl 51.5). Deus falou por meio do profeta Isaías (48.8): “Eu sabia que procederias mui perfidamente e eras chamado de transgressor desde o ventre materno”. E Paulo disse: “Éramos, por natureza, filhos da ira, como também os demais” (Ef 2.3). Mas nesta passagem de João somos informados de que a incapacidade do homem natural e sua aversão por Cristo são tão grandes, que não podem ser vencidas por qualquer outro poder, exceto o poder de Deus. “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer; e eu o ressuscitarei no último dia” (Jo 6.44). Nunca houve um mestre como Cristo. “Jamais alguém falou como este homem” (Jo 7.46).

Ele falava com muita autoridade, não como os escribas, mas com dignidade e poder celestial. Ele falava com grande sabedoria. Falava a verdade sem qualquer imperfeição. Seus ensinos eram a própria luz proveniente da Fonte de Luz. Ele falava com bastante amor, com o amor dAquele que estava prestes a dar a sua vida em favor de seus seguidores. Falava com mansidão, suportando a ofensa contra Ele mesmo vinda dos pecadores, não ultrajando quando era ultrajado. Jesus falava com santidade, porque era Deus “manifestado na carne”. Mas tudo isso não atraía os seus ouvintes. Nunca houve um dom mais precioso oferecido aos homens. “O verdadeiro pão do céu é meu Pai quem vos dá... Eu sou o pão da vida; o que vem a mim jamais terá fome; e o que crê em mim jamais terá sede” (Jo 6.32, 35).

O Salvador de que as pessoas condenadas necessitavam estava diante delas. Sua mão lhes foi estendida. Ele estava ao alcance delas. O Salvador ofereceu-lhes a Si mesmo. Oh! Que cegueira, dureza de coração, morte espiritual e impiedade desesperadora existem na pessoa não-convertida! Nada pode mudá-la, exceto a graça do Todo-Poderoso. Ó Homem destituído da graça de Deus, seus amigos o advertem, os pastores clamam em voz alta, a Bíblia toda o exorta. Cristo, com todos os seus benefícios é colocado diante de você. Todavia, a menos que o Espírito Santo seja derramado em seu coração, você permanecerá um inimigo da cruz de Cristo e destruidor de sua própria alma. “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer”.

Quão invencível é a graça de Jeová! Nenhuma criatura tem o poder de atrair o homem a Cristo. Exibições, evidências miraculosas, ameaças, inovações são usadas em vão. Somente Jeová pode trazer a alma a Cristo. Ele derrama seu Espírito com a Palavra e a alma sente-se alegre e poderosamente inclinada a vir a Jesus. “Apresentar-se-á voluntariamente o teu povo, no dia do teu poder” (Sl 110.3). “Acaso, para o Senhor há coisa demasiadamente difícil?” (Gn 18.14.) “Como ribeiros de águas assim é o coração do rei na mão do Senhor; este, segundo o seu querer, o inclina” (Pv 21.1).

Considere um exemplo: um judeu estava assentado na coletoria, próxima à porta de Cafarnaum. Sua testa estava enrugada com as marcas da cobiça, e seus olhos invejosos exibiam a astúcia de um publicano. Provavelmente ele ouvira falar de Jesus; talvez o tivesse ouvido pregando nas praias do mar da Galiléia. Mas seu coração mundano ainda permanecia inalterado, visto que ele continuava em seu negócio ímpio, assentado na coletoria.

O Salvador passou por ali e, olhando para o atarefado Levi, disse-lhe: “Segue-me!” Jesus não disse mais nada. Não usou qualquer argumento, nenhuma ameaça, nenhuma promessa. Mas o Deus de toda graça soprou no coração do publicano, e este se tornou disposto. “Ele se levantou e o seguiu” (Mt 9.9). Agradou a Deus, que opera todas as coisas de acordo com o conselho da sua vontade, dar a Mateus um vislumbre salvador da excelência de Jesus; a graça caiu do céu no coração de Mateus e o transformou. Ele sentiu o aroma da Rosa de Sarom. O que significava o mundo agora para ele? Mateus não se importava mais com os lucros, os prazeres e os louvores do mundo. Em Cristo, ele viu aquilo que é mais agradável e melhor do que todas essas coisas do mundo. Mateus se levantou e seguiu a Jesus.

Aprendamos que uma simples palavra pode ser abençoadora à salvação de almas preciosas. Frequentemente somos tentados a pensar que tem de haver algum argumento profundo e lógico para trazer as pessoas a Cristo. Na maioria das vezes colocamos nossa confiança em palavras altissonantes. No entanto, a simples exposição de Cristo aplicada ao coração pelo Espírito Santo vivifica, ilumina e salva. “Não por força nem por poder, mas pelo meu Espírito, diz o Senhor dos Exércitos” (Zc 4.6). Se o Espírito age nas pessoas, estas simples palavras: “Segue a Jesus”, faladas em amor, podem ser abençoadas e salvar todos os ouvintes.

Aprendamos a tributar todo o louvor e glória de nossa salvação à graça soberana, eficaz e gratuita de Jeová. Um falecido teólogo disse: “Deus ficou tão irado por Herodes não lhe haver dado glória, que o anjo do Senhor feriu imediatamente a Herodes, que teve uma morte horrível. Ele foi comido por vermes e expirou. Ora, se é pecaminoso um homem tomar para si mesmo a glória de uma graça tal como a eloquência, quão mais pecaminoso é um homem tomar para si a glória da graça divina, a própria imagem de Deus, que é o dom mais glorioso, excelente e precioso de Deus?” Quantas vezes o apóstolo Paulo insiste, em Efésios 1, que somos salvos pela graça imerecida e gratuita? E como João atribui toda a glória da salvação à graça gratuita do Senhor Jesus — “Àquele que nos ama, e, pelo seu sangue, nos libertou dos nossos pecados... a ele a glória e o domínio pelos séculos dos séculos. Amém!” (Ap 1.5, 6).

Quão solenes foram as palavras de Jonathan Edwards, em sua obra Personal Narrative (Narrativa Pessoal)!

“A absoluta soberania e graça gratuita de Deus, em demonstrar misericórdia àquele para quem Ele quer expressar misericórdia, e a absoluta dependência do homem quanto às operações do Espírito Santo têm sido para mim, frequentemente, doutrinas gloriosas e agradáveis. Estas doutrinas têm sido o meu grande deleite. A soberania de Deus parece-me uma enorme parte de sua glória. Tenho sentido deleite constante em aproximar-me de Deus e adorá-Lo como um Deus soberano, rogando-Lhe misericórdia soberana”.

Ao sentir-me à graça um grande devedor Sou constrangido sempre, a todo instante! Que esta graça, com algemas, meu Senhor, Prenda somente a Ti meu coração hesitante.
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Robert Murray M’Cheyne (1813-1843) foi ministro de St Peter’s Church Dundee, Escócia (1836-1843). Foi um piedoso pastor evangélico e evangelista com grande amor pelas almas.