quinta-feira, abril 19, 2007

MARTYN LLOYD-JONES, A SEGUNDA BÊNÇÃO E O MINISTÉRIO PASTORAL

Dias atrás, conversava com um estudante de teologia e falávamos sobre livros e autores. Perguntei-lhe se havia lido os escritos do Dr. Martyn Lloyd-Jones. Sua resposta foi que tinha lido apenas um livro e depois emendou: “Mas ele crê na segunda bênção”.

Primeiramente é preciso dizer que o ensino de Martyn Lloyd-Jones é completamente diferente da doutrina pentecostal acerca da “segunda bênção”. Segundo Frederick Dale Bruner, em sua obra “Teologia do Espírito Santo”, a experiência pentecostal deve ser compreendida “como a experiência do batismo e conseqüentes dons do Espírito Santo” [1]. “A evidência glossolálica”, continua Bruner, “tem marcado o pentecostalismo. Argumenta-se até, e com seriedade, que o ato teológico de combinar o batismo no Espírito Santo com a evidência das línguas foi o catalisador que criou o movimento pentecostal” [2]. Para o movimento pentecostal ser batizado com o Espírito é uma doutrina fundamentada em Atos 2.4: “Todos ficaram cheios do Espírito Santo e passaram a falar em outras línguas, segundo o Espírito lhes concedia que falassem” , portanto,“ser pentecostal (...) é ser cheio do Espírito Santo da mesma maneira que eles (os discípulos em Atos 2) foram cheios com o Espírito Santo naquela ocasião” [3]. Para eles, o batismo com o Espírito Santo, é um evento distinto da conversão, é evidenciado pelo falar em línguas e deve ser buscado com sinceridade.
Lloyd-Jones, em seu livro “La Vida en el Espíritu” (A Vida no Espírito), interpretando o texto citado acima, nos ensina que o batismo no Espírito “é uma capacitação e investidura de poder com o propósito de realizar uma tarefa determinada” [4]. Sua argumentação se apóia em outros textos. Êxodo 31.2-4: “Disse mais o Senhor a Moisés: Eis que chamei pelo nome a Bezalel, filho de Uri, filho de Hur, da tribo de Judá, e o enchi do Espírito de Deus, de habilidade, de inteligência e de conhecimento, em todo artifício, para elaborar desenhos e trabalhar em ouro, em prata, em bronze”. Lucas 1.15: “Pois ele (João Batista) será grande diante do Senhor, não beberá vinho, nem beberá bebida forte e será cheio do Espírito Santo. Lucas 1.41, 42: “Ouvindo esta a saudação de Maria, a criança lhe estremeceu no ventre; então Isabel ficou possuída do Espírito Santo. E exclamou...” Lucas 1.67: “Zacarias, seu pai, cheio do Espírito Santo, profetizou...” (os grifos são meus). Em todas estas passagens vemos que “pessoas foram cheias com o Espírito e investidas de um poder e uma habilidade fora do comum” [5]. Este também foi caso de Pedro que, diante do Sinédrio, falou cheio do Espírito (Atos 4.1) e da igreja primitiva que após a oração, “...todos ficaram cheios do Espírito Santo e, com intrepidez, anunciavam a palavra de Deus” (Atos4.31). Assim, conclui Lloyd-Jones,“um homem que é cheio do Espírito pode repentinamente ser cheio do Espírito Santo para um propósito especial” [6]. Esta bênção não é algo que conquistamos, mas é um milagre que Deus opera na vida do crente. O batismo com o Espírito Santo é “uma experiência definida. Todas estas pessoas eram conscientes do fato de que o Espírito Santo veio sobre eles, e que haviam sido investidos de novo poder com autoridade. Sabiam perfeitamente o que havia ocorrido. De modo que esta experiência descreve algo que nos ocorre; uma experiência em que somos conscientes de receber poder para um propósito específico. Por isso, dizemos que isto é algo distinto e claro” [7]. È isto que Martyn Lloyd-Jones chama de batismo com o Espírito Santo. Uma capacitação especial de poder para proclamar com intrepidez o Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo. Contudo, “é inútil esperar qualquer grande bênção de Deus se estivermos em desobediência” [8], isto é, em pecado.
A exortação paulina para encher-nos do Espírito (Efésios 5.18) não tem o mesmo significado que em Atos 2.4, quando os discípulos “ficaram cheios do Espírito Santo”. O movimento pentecostal faz confusão com a terminologia. Para Paulo ser cheio do Espírito é estar de baixo da influência do Espírito Santo. Isto acontece quando a nossa mente, coração e vontade, toda a nossa personalidade é controlada pelo Espírito de Cristo. Há uma distinção entre o batismo com o Espírito Santo e a plenitude do Espírito. Assim, “não pode ser ‘batizado com o Espírito’ sem ser ‘pleno do Espírito’. Mas é possível ser ‘pleno do Espírito’, pode estar cheio dele, sem experimentar ‘o batismo do Espírito’. O batismo é uma experiência distinta, concreta e especial” [9]. Mas a plenitude do Espírito, “não se trata de algo que é derramado em meu interior de modo q1ue eu tenha que esvaziar primeiro a fonte para logo recebê-lo. Essa forma de pensar é totalmente errônea e faz violência à pessoa do Espírito Santo” [10].

“Enchei-vos do Espírito” é um mandamento e não uma experiência. Nós devemos deixar o Espírito influenciar nossas vidas. O verbo está no tempo presente. Isto é significativo na língua grega, pois o tempo presente indica uma ação contínua. É algo que, momento a momento, devemos buscar. Outro fato a destacar é que o verbo encher está no plural, indicando que é um mandamento dado a todos os cristãos, principalmente a nós ministros de Cristo. Por último, o verbo está na voz passiva. A NVI traduz Efésios 5.18 corretamente: Não se embriaguem com vinho, que leva à libertinagem, mas deixem-se encher pelo Espírito. Mas isso não significa que somos passivos neste processo, pelo contrário, devemos deixar-nos encher pelo o Espírito.

A Bíblia nos aponta algumas condições que devem ser observadas para que possamos ser cheios do Espírito:

a) Não entristecer o Espírito (Efésios 4.30). Martyn Lloyd-Jones nos diz: “Se eu desejo ser cheio e controlado pelo Espírito, devo evitar que os meus desejos, paixões e meus apetites me controlem. Tampouco deve me controlar o diabo. Devo resistir ao diabo e também devo resistir ao ‘mundo’. Isso é óbvio; não devo contristar o Espírito. Se eu vivo uma vida de pecado, estou contristando-o; e se Ele está entristecido, não me controla” [11].
b) Não apagar o Espírito (1Tessalonicenses 5.19). O Espírito é uma pessoa, a terceira pessoa da Trindade, e habita no cristão para estimular, guiar, direcionar o seu viver. Todas as vezes que rejeitamos seus estímulos e idéias, nós o apagamos. Este direcionamento que recebemos do Espírito é através de sua Palavra. O Espírito e a Palavra estão intimamente ligados, pois a Escritura é o instrumento usado pelo Espírito para nos falar. Assim, deixar de ler, estudar e é apagar o Espírito.
c) Andar no Espírito (Gálatas 6.16). Aqui somos ensinados que, se andamos no Espírito, não satisfaremos a concupiscência da carne. Mas, somos nós que devemos andar. Depois, devo escutar a voz do Espírito. Ele nos fala através da Palavra, pois ela é a Palavra do Espírito (2 Pedro 1.21). A santificação consiste num processo de se conhecer a Palavra de Deus e aplicá-la em nossa vida. E quando isto ocorre o Espírito se alegra, pois permitimos que Ele governe nossas decisões, nossas ações e todo o nosso comportamento. “Os pastores têm de transformar em um assunto de prioridade e disciplina o ler, meditar e o memorizar as Escrituras. Eles também precisam orar pela obra do Espírito Santo em suas próprias vidas. Qualquer outro procedimento pastoral, que corresponda a menos do que isso, será uma prática espiritual incorreta” [12]. Que a plenitude do Espírito seja buscada continuamente e Deus, segundo Sua soberania, dispense-nos do seu poder para que muitas vidas sejam alcançadas pela Sua maravilhosa graça.



[1]Bruner, F. D., Teologia do Espírito Santo, p.46.

[2]Bruner, F. D., op. Cit. p.58.

[3] Op. Cit., p.45

[4] La Vida en el Espíritu, p.40

[5] D.M.Lloyd-Jones, op. Cit., p.41.

[6] Op.cit., p.42

[7] D.M.Lloyd-Jones, op. cit., p.40

[8] D.M.Lloyd-Jones, O Segredo da Bênção Espiritual, p.47

[9] D.M.Lloyd-Jones, op. cit., p.38

[10] D.M.Lloyd-Jones, op.cit., p.44

[11] Op. Cit., p.46

[12] Tomas K. Ascol in Fé para Hoje, número 16, 2002

Nenhum comentário: