quinta-feira, setembro 17, 2020

A CARTA AOS FILIPENSES: UMA INTRODUÇÃO

Introdução

Para muitos autores, Filipenses é a carta mais encantadora que Paulo tenha escrito jamais. Foi chamada de duas maneiras: A epístola das coisas excelentes — como efetivamente o é — ou A epístola da alegria. Escreve: “Alegrai-vos sempre no Senhor; outra vez digo: alegraivos.” Várias vezes aparecem as palavras alegria e regozijo. Enquanto está na prisão dirige os corações de seus amigos — e nossos corações — a uma alegria da qual ninguém pode nos privar.1 Embora em circunstâncias humanamente tão desfavoráveis, uma vez que o apóstolo estava preso por causa do Evangelho, Paulo estava confiante no Senhor. Nesta carta ele expressou todo o seu ânimo, incentivando os filipenses a desenvolverem em parceria com o Espírito Santo esse aspecto do fruto espiritual, a alegria cristã.

A vida cristã é uma corrida em direção ao alvo. Paulo escreveu: Irmãos, quanto a mim, não julgo havê-lo alcançado; mas uma coisa faço: esquecendo-me das coisas que para trás ficam e avançando para as que diante de mim estão, prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus (Filipenses 3.13,14). Não podemos nos desviar nem para a direita nem para a esquerda; tampouco podemos parar. A Epístola aos Filipenses oferece subsídios a todos quantos estão prosseguindo para o alvo. É uma mensagem de estímulo ao desenvolvimento da salvação, através de uma vida consagrada, bem firmada na Palavra e cheia de esperança, a qual nos exorta a viver alegremente, desenvolvendo uma conduta santa e valorizando a cooperação entre os membros da família da fé. Convido você a iniciar esta jornada conosco.

 1. O apóstolo Paulo e a Igreja de Filipos

Paulo foi chamado para ser apóstolo dos gentios e assim percorria as estradas romanas anunciando o Evangelho e organizando os discípulos nas principais cidades das províncias imperiais, que eram centros estratégicos. É nestes centros que ele concentrou suas atividades evangelísticas e tinha como objetivo alcançar o maior número de pessoas possível. Fo durante a sua segunda viagem missionária que ele e seus companheiros, chegaram em Filipos, de pois de ter uma visão, na qual um varão macdônio lhe pedia para ir à Macedônia (Atos 16.6-10). Filipos, cidade que desfrutava do status de colônia romana era um centro importante não só por sua condição polítca, mas também geográfica e comercialmente, foi a primeira cidade da região macedônica a receber Paulo e seus companheiros (Atos 16.11,12).

O registro de Atos dá conta da primeira conversão acontecida naquela região: Lídia, uma mulher piedosa e comerciante. Lídia, chegou da Ásia com seus tesouros, para em seguida descobrir na Europa os tesouros espirituais.2 Além dela, converteu-se a Cristo a jovem que fora tomada por um espírito maligno; e, ainda, a família do carcereiro da cidade (talvez alguns detentos também tenham se convertido). Estava plantada assim a semente da igreja cristã naquela cidade. Alguns anos mais tarde, Paulo escreveu uma mensagem para aquela igreja. O apóstolo voltaria a visitar aqueles crentes por ocasião da terceira viagem missionária, provavelmente no ano 57 (At 20.1,2) e ainda no ano seguinte (At 20.3-6). Há que se fazer uma observação aqui. É possível perceber o caráter universal do Evangelho. Em Atos 16, a narrativa se concentra em três personagens de diferentes nacionalidades: Lídia, uma distinta vendedora, asiática, da cidade de Tiatira; uma jovem escrava, que era de um dos países derrotados por Roma nas suas constantes conquistas; e, por último, o carcereiro, que era cidadão romano.3

A leitura da Epístola aos Filipenses deixa claro que havia uma relação de muito carinho entre os crentes filipenses e Paulo. Pelo menos em duas ocasiões, eles colaboraram financeiramente com o seu ministério: quando ele estava em Tessalônica (Fp 4.15,16) e, depois, quando estava em Corinto (II Co 11.9). Quando Paulo escreve a Epístola aos Filipenses, o faz para agradecer aos crentes o envio de outra oferta, que fora encaminhada por Epafrodito, o qual fora incumbido pela igreja especialmente para fazer a ajuda chegar às mãos do apóstolo (Fp 4.10-20). Curiosamente, ao se apresentar, Paulo não o faz como “apóstolo”, mas simplesmente como “servo de Jesus Cristo”.

Em Atos 16.13 observa-se que depois de chegar ali Paulo dirige-se “onde pareceu haver um lugar de oração”. Isto nos leva afirmar que havia poucous judeus em Filipos, pois neste lugar de oração não havia homens e nem havia um culto formal e nem leitura da lei e dos profetas. Portanto, este lugar de oração não se refere uma sinagoga, mas um lugar onde mulheres se reuniam para suas devoções de caráter judaico4. Assim é possível concluir que a igreja de Filipos era constituída em sua maioria por gregos convertidos ao evangelho de Jesus.  

A carta que Paulo escreveu aos cristãos da cidade de Filipos é um tesouro precioso. Não é sem razão que, ao longo dos séculos, a Epístola aos Filipenses tem alimentado a espiritualidade e a fé dos cristãos. Em um texto de apenas quatro capítulos, o apóstolo apresenta ensinamentos muitíssimo valiosos para a caminhada cristã. Filipenses não é um tratado doutrinário propriamente; antes, é um texto fortemente pastoral, isto é: um texto que apresenta a mensagem do coração de um dedicado pastor à igreja que ama. Filipenses não é uma carta famosa e conhecida como Romanos ou Efésios. Mas, nem por isso é menos importante para cristãos que querem crescer na fé. Percebe-se forte tom pessoal na carta: há 51 referências a pronomes pessoais (“eu”, “meu”, “mim”, “minha”, “me”). ​O presente estudo visa apresentar uma panorâmica da Epístola aos Filipenses. É apenas um “aperitivo”, com a intenção de despertar o desejo de estudar mais essa porção bíblica, com vistas ao aprofundamento da fé.

2. Data e ocasião

​Não é tarefa fácil afirmar de forma absoluta a data da redação dessa epístola. No entanto, tudo indica que deve ter sido escrita entre os anos 50 e 63 do primeiro século da era cristã. Mas essa questão é de somenas importância. O que vale realmente é a mensagem da epístola. Sabe-se também, com certeza, que quando Paulo escreveu essa carta estava preso: “E quero que vocês saibam isto, queridos irmãos: tudo quanto me aconteceu aqui tem sido uma grande ajuda na divulgação da Boa Nova a respeito de Cristo. Porque todo mundo aqui, incluindo todos os soldados, de ponta a ponta nos quartéis, sabem que estou na cadeia simplesmente porque sou cristão. E por causa da minha prisão muitos dos cristãos daqui parecem ter perdido o medo de ser presos! De algum modo minha resignação os animou e eles começaram a ter cada vez mais coragem para falar de Cristo aos outros.” (Fp 1.12-14, A Bíblia Viva). Ninguém sabe ao certo que prisão foi essa que Paulo enfrentou. Várias hipóteses já foram apresentadas. Alguns pensam que ele estava preso na própria Roma, a capital do Império. Outros pensam que a prisão foi em Éfeso, ou em Cesareia. Mas essa questão, no final das contas, não é tão importante. O que importa é que, mesmo preso, Paulo manda para a igreja dos filipenses uma mensagem, na qual importantes temas da vida cristã são tratados. É o que será visto a seguir.

 3. Principais temas da Epístola aos Filipenses

Como já foi dito, a carta aos Filipenses não foi escrita com a intenção de ser um tratado dogmático. Mas, essa mensagem pastoral de Paulo muito tem a nos ensinar. Em resumo, os principais temas da Epístola aos Filipenses são:

a)   Humildade – A cidade de Filipos era colônia romana, um alto privilégio no tempo do Novo Testamento (At 16.12). Um cidadão de Filipos tinha os mesmos direitos legais de um cidadão de Roma. Ser cidadão romano, naqueles dias, era o mesmo que ser cidadão dos Estados Unidos em nossos dias. Para crentes que viviam em um contexto assim, Paulo escreve recomendando a humildade. Em 3.20 está escrito: “pois a nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo.” A palavra traduzida como “pátria” significa literalmente “cidadania”. Paulo ensina que, mais importante do que ser cidadão romano, é ser cidadão da pátria celestial. A exortação à humildade, feita por Paulo, é forte: “nada façais por partidarismo ou vanglória, mas por humildade, considerando cada um os outros superiores a si mesmo.” Além disso, em uma passagem que se tornou muitíssimo conhecida (2.1-11), Paulo ensina aos crentes a que sejam humildes, tendo por modelo de humildade o próprio Senhor Jesus;

b) Inabalável comunhão com Cristo – Nessa epístola, encontramos a filosofia de vida do apóstolo Paulo: “porquanto, para mim, o viver é Cristo, e o morrer é lucro” (1.21). Conforme o pensamento paulino, a vida em Cristo, com Cristo e por Cristo supera até a morte (1.23,24). Aqueles que morrem no Senhor estão em um estado de consciente felicidade, além de qualquer realidade experimentada na terra. Esse ensinamento paulino nos enche de conforto e esperança;

c) Desafio à santificação – Em Filipenses 3.8 a 16, o apóstolo ensina a respeito da santificação, de uma maneira muito interessante: o crente não se baseia em seus próprios méritos, mas apenas nos méritos de Cristo Jesus (3.9,10). Ao mesmo tempo, a santificação é apresentada como algo que exige e envolve esforço dos crentes, os quais devem buscar seu progresso espiritual (1.9; 2.12-16; 4.8,9);

d) Solução de conflitos comunitários – A igreja dos filipenses era uma comunidade muito especial, carinhosa e amorosa para com o apóstolo. Contudo, havia conflitos naquela igreja. Paulo exorta aos crentes a que busquem a superação desses conflitos que, infelizmente, podem acontecer em qualquer igreja (2.14,15). No final da epístola, Paulo chega a citar nomes de pessoas envolvidas em um conflito: “Rogo a Evódia e rogo a Síntique, pensem concordemente no Senhor.” (4.2). Em qualquer igreja pode haver conflitos entre seus membros; mas todos devem se esforçar para que tais conflitos sejam solucionados;

e) Alegria – O tema da alegria cristã está presente em praticamente todo o texto da epístola (1.25; 3.1; 4.4,10). A alegria cristã não é exatamente um sentimento. É mais um modo de ser, uma atitude que leva o cristão a ver a vida, com seus altos e baixos, com base na fé no Senhor da igreja. Desse modo, é possível olhar além das crises que deprimem e desanimam e contemplar pela fé o Senhor soberano sobre todas as coisas.

 

Aplicação

A carta aos Filipenses, como vimos, é uma das cartas mais pessoais de Paulo e ocupa-se centralmente do seguinte:

Capítulo 1: Paulo fala da sua presente situação

Capítulo 2: O apóstolo anela possuir a mente de Cristo

Capítulo 3: Anela ter o conhecimento de Cristo

Capítulo 4: Anela ter a paz de Cristo

Deste nosso primeiro encontro podemos destacar duas lições importantes:

1)  Somos peregrinos neste mundo: Fp 1.27-29 e 3.20

2) Como Paulo, devemos ter estratégias para alcançar o maior número de pessoas com o Evangelho de Cristo.

 


1  Barclay, W. A Carta aos Filipenses, p.16.

2  Hendrickesn, W. Filipenses, p. 22.

3  De Souza, I. N. (2008). Filipenses: A Carta da Alegria (Primeira edição, p. 20). São Paulo, SP: Rádio Trans Mundial.

4  Hendricksen, W. Filipenses, p.20.

quinta-feira, setembro 10, 2020

A Natureza Divina de Cristo - João 1.1-5

Encontramos nestes versículos iniciais do Evangelho de João uma declaração de incomparável sublimidade a respeito da natureza divina do nosso Senhor Jesus Cristo. Acima de qualquer dúvida, quando João menciona “o Verbo” está se referindo a Cristo. Com toda certeza, há grande profundidade nesta declaração, cuja compreensão está muito além do entendimento do homem. Ainda assim, há claros ensinamentos na passagem, os quais todo crente deveria guardar como tesouro no coração, 
Primeiro, aprendemos que o Senhor Jesus Cristo é eterno. João diz que “no princípio era o Verbo”. Ele não começou a existir quando os céus e a terra foram formados e, muito menos, quando o evangelho foi trazido ao mundo. Ele tinha a glória com o Pai “antes que houvesse mundo” (Jo 17.5). Existia quando a matéria foi criada e antes que começassem os tempos. “Ele é antes de todas as coisas” (Cl 1.17); Jesus existe desde toda a eternidade. 
Segundo, aprendemos que o nosso Senhor Jesus Cristo é uma pessoa distinta de Deus, o Pai; e, ainda assim, é um com Ele. João diz que “o Verbo estava com Deus”. O Pai e o Verbo, embora sejam duas pessoas, são ligados por uma união inefável. Desde a eternidade, onde quer que Deus Pai estivesse, ali também estava o Verbo, o Deus Filho — iguais em glória, co-eternos em majestade, mas uma só Divindade. Este é um grande mistério. Feliz aquele que o recebe com a atitude de uma criança, sem tentar explicá-lo! 
Terceiro, aprendemos que o Senhor Jesus Cristo é o próprio Deus. João diz que “o Verbo era Deus”. Ele não é meramente um anjo criado ou um ser inferior a Deus, o Pai, investido de poder, da parte do Pai, para redimir os pecadores. Não é menos que o Deus perfeito; é igual ao Pai, no que concerne à sua divindade; Ele é Deus, possuindo a mesma natureza que o Pai e existindo antes da fundação do mundo. 
Quarto, aprendemos que o Senhor Jesus Cristo é o Criador de todas as coisas. João diz que “todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e sem ele nada do que foi feito se fez”. Longe de ser uma criatura de Deus, Ele é o Ser que fez o universo e tudo o que nele há. O apóstolo nos diz que Jesus “é o primogênito de toda a criação; pois nele, foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para ele” (Cl 1.15,16).
Por último, aprendemos que o Senhor Jesus Cristo é a fonte de toda luz e vida espirítual. João diz que “a vida estava nele, e a vida era a luz dos homens”. Ele é a fonte eterna, e somente dela os filhos dos homens têm recebido vida. Em todos os tempos, a maior parte da humanidade tem-se recusado a conhecê-Lo, esquecendo-se da Queda e da necessidade de um Salvador pessoal. A luz tem constantemente resplandecido “nas trevas”, e a maioria dos homens não a tem compreendido. Mas, aqueles que já receberam luz e vida espiritual, devem tudo isso a Cristo. 

*Texto adaptado do livro de J.C. Ryle - Meditações no Evangelho de João